Dia#04 | Caminho Francês
Dia#4
Distância: 16km
Tempo de caminhada: 6 horas
Clima: Chuva / Nublado / Sol
Temperatura: Mín: 17° / Máx: 28°
Saída: Obanos
Chegada: Lorka
Data: 10/09/2017
Palavra do dia: Abraço
Resumo do dia: Levantei às 5:00. Sem despertador. Estava sem sono. Muita endorfina no corpo. Queria caminhar. Ainda estava escuro. Me arrumei. A roupa que eu lavei ainda não estava seca. Estava chuviscando. Guardei toda a roupa molhada em uma sacola plástica e coloquei na mochila. Cuidei do meu pé. Passei vaselina antes de colocar a meia para evitar bolhas e acabar de curar a que eu tive no 2o dia. Um senhor se aproximou de mim e me ofereceu um pão. Agradeci, mas disse que tinha comida. Ele falou: “leve com você, pode precisar no caminho.” É verdade. Sorri. Peguei o pão. Coloquei na mochila. Se ele estava me oferecendo, tinha algum motivo. Aqui, a gente aprende a aceitar tudo que a vida nos dá. Coloquei a capa de chuva na mochila e comecei a caminhar. A ideia era caminhar menos hoje e chegar mais cedo no próximo destino e não ter problema para conseguir uma cama. Eu precisava descansar. Os primeiros três dias tinham sido intensos. Caminhei com o mesmo grupo de ontem e mais o esloveno que conheci no 2o dia na cafeteria (Gasper). Éramos 5 no total. Depois de alguns minutos de caminhada o Esloveno percebeu que esqueceu sua carteira e seus documentos no albergue. Voltou para buscar. Disse que nos alcançava depois. Ele tinha uma passada rápida. A chuva parou. Tirei a capa da mochila. Paramos alguns quilômetros adiante para comer. Sentamos em uma pequena mesinha redonda. A atendente falava português. Pedi uma tortilha e um café. Olhei para o lado e vi um filhote de passarinho no chão. Ele havia caído do seu ninho. Meu coração ficou partido. Meu estômago ficou embrulhado. Perdi a fome. Não posso ver um animal sofrendo que sofro junto. Na hora de ir embora, a atendente perguntou se a sacola de plástico que estava na bancada era minha. Eu disse que não. Ela falou: “leve com você, você pode precisar.” Tinha uma maçã dentro. Achei estranho. Seria uma mensagem do universo dizendo que deveria comer mais. Não contestei. Levei a sacola comigo e pendurei na mochila. Continuamos a caminhada. Voltou a chuviscar. Bota capa. Parou de novo. Tira capa. Veio o frio. Bota o casaco. Fez calor. Tira o casaco. Finalmente o sol firmou. (Como durante o Caminho você está andando constantemente, o tempo muda toda hora de acordo com a região em que você se encontra, por isso, existem dias que tudo muda o tempo tempo. Assim como a vida.) A temperatura ficou agradável. A caminhada foi tranquila. Passamos por um vilarejo que estava tendo a “Festa da Uva”. Muito vinhos para degustação. Não tomei nenhum. Naquele calor, se eu tomasse um vinho, eu i cair no chão. Fiquei no suco de uva. Tava animado. Tinha até banda passando. Continuei a caminhada. Alguns quilômetros adiante, avistamos um pequeno vilarejo (Lorka). Era o nosso destino do dia. Chegamos às 13:00. Estava cedo. Não tinha vaga no primeiro albergue que fomos. Olhamos para o outro lado da rua. Tinha outro albergue. Entramos. Tinha vaga. Fizemos check-in. Deixamos a mochila ao lado da recepção e sentamos para almoçar. Estávamos famintos. Comemos pizza. Estava uma delícia. De repente, meu amigo Húngaro (Borisz), parou de comer e ficou olhando pra frente em silêncio. Depois de alguns segundos ele disse: “Eu acabei de ter uma visão. Vi um lugar. Um pequeno vilarejo. Sei que é aqui no caminho. Mas não sei exatamente onde é. Acho que tem algo pra mim lá. Deve ser um sinal.” Ficamos felizes por ele. O caminho tem dessas coisas inexplicáveis. Cada um ganha um presente diferente. Acabamos de almoçar. Subi para o quarto. Peguei minha cama. Arrumei minhas coisas. Uma pessoa se aproximou e me perguntou se podia me dar um abraço. Claro que pode! Recebi um longo abraço. Foi sincero. Senti alguma coisa pesada saindo do meu peito. Fiquei leve. Calma. Serena. Tranquila. Feliz. Agradeci. Sorri. Que presente! Inesquecível. Lavei a alma. Lavei a roupa. Coloquei no sol pra secar e saí para dar uma volta enquanto ouvia música no ipod. Encontrei um balanço. Sentei. Me embalei. Lembrei da minha infância. Me emocionei. Chorei. Passou um coroa com um violão por mim e sorriu. Acho que ficou feliz com minha alegria de menina. Eu queria ficar no sol. Estava na sombra. Procurei outro lugar. Achei um banco vazio. Deitei. Ouvi uma música ao longe. Fui ver o que era. O coroa estava tocando violão em um bar e sua esposa cantando. Também eram peregrinos. Tocavam por onde passavam. Me chamaram pra sentar. Ouvi músicas lindas. Me emocionei. Lembrei de um antigo amor. Chorei. Um menino pediu minha mão para dançar. Foi inesperado. Era um música lenta. “The Sound of Silence”. Metafórica. Fechei os olhos. Me desliguei do mundo. Senti a música. Nunca dancei assim. Foi diferente. Real. Especial. Acabou a música. Ganhei um forte abraço. Ele foi embora. Fui pro albergue. Reencontrei amigos do caminho. Sentei. De repente, minha pressão baixou. Parecia que eu ia desmaiar. Me senti fraca. Talvez aquele pão e aquela maçã que ganhei durante o dia, tinha sido realmente um sinal. Eu precisava comer mais daqui pra frente. Novo aprendizado. Uma amiga me deu sua barra de proteína. Melhorei. Chegou a hora da janta. Muitos amigos que fiz nos primeiros dias estavam no mesmo albergue. Conversamos. Jantamos. Comemos macarronada. Prato farto. Menu do peregrino. Bebemos vinho. Brindamos. Celebramos a vida. Rimos MUITO. Brincamos de “Eu Nunca”. Foi divertido. Juventude é igual em qualquer lugar do mundo. Fico tarde. Deitamos. Muito ronco. Pouco sono. Dormi pouco. Quase nada. Porém leve e feliz!
Aprendizados: Um abraço sincero vale mais que mil palavras. Surpresas são os melhores presentes da vida. O amor aquece o coração.